quarta-feira, agosto 11, 2004

Ano santo em Santiago de Compostela

Fez no príncipio deste mês de Agosto um ano que peregrinei a pé até Santiago de Compostela. É mais uma daquelas ocasiões em que as palavras parecem não chegar, mas em que o impulso de partilhar, de reviver, de exprimir também não me deixa ficar calada.

Passo à frente da maneira como em geral se acha que ir a Compostela é muito espiritual e aventureiro, enquanto ir a Fátima é ser tacanho; a verdade é que ao início também me impeliu mais o simples desejo de partida que um apelo espiritual.Mas comecei a caminhar e acabei a peregrinar: caminhar assim, desta maneira especial, abre o coração de uma maneira rara: presta-se ao silêncio interior de onde pode nascer a oração e que dá espaço para que Ele entre e fale sem outras vozes a tapar, aquele tipo de silêncio e disponibilidade que se torna difícil quando há toda a vida mais quotidiana a puxar por nós.

Acho que é por isso que todos sentimos pelo menos uma vez, até os mais sedentários, desejo de viajar. Sair dos horizontes a que acostumámos os nossos olhos fá-los olhar não só para coisas novas como olhar de maneira diferente (mais isenta, objectiva??) para nós próprios e para o horizonte do qual nos afastámos.

Mas porque é que peregrinar é diferente?
Ando a ler um livro em que se critica a mania que temos de dizer que precisamos de "espaço", e de confinarmos a nossa realização a um qualquer espaço vazio que perseguimos constantemente e podemos encher como nós quisermos. Para já não falar de um espaço assim ser quase utopia, é desligado do resto da vida, absolutizado em detrimento da vida como um todo (acharmos que toda a nossa felicidade depende só da carreira, ou só de uma relação, qualquer coisa). Não passará a riqueza da peregrinação por constituir um espaço verdadeiro, sem pretensões de vir resolver tudo e mais alguma coisa? Espaço no verdadeiro sentido do termo porque não está cheio de toda a nossa tralha, é antes um receptáculo, um convite (mesmo que nem sempre seja um convite totalmente consciente) para que entre Ele.

Se o permitirmos, se quisermos caminhar com Cristo e para Cristo - qualquer que seja a devoção em particular que nos leva - peregrinar amadurece, purifica, fortalece a nossa Fé e a nossa vida. Faz de nós um pouco mais dignos de sermos "sacrários ambulantes". E ensina o gosto pelo Caminho como poucas coisas conseguem. :)


E um muito obrigado a todos (mas nesta data em especial aos que acompanhei a Santiago) os que comigo já partilharam caminho, o seu caminhar, e a Graça de crescer um pouco mais.

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